Exercícios Olfativos – 1. um passeio pelo aroma




Os aromas naturais diferem dos artificiais pela profundidade e complexidade de suas camadas. Eles escondem informações, liberam aos poucos suas notas, se transformam... 

Nesta primeira brincadeira, o convite é para que passeemos pelo aroma, que nos deixemos levar por suas formas, por suas características olfativas, sem nos perdermos em todas as associações subjetivas possíveis. 
Este talvez seja o mais difícil dos exercícios (ao menos o foi para mim...), porque exige um esforço investigativo direcionado. 
Para começar, separe o objeto que irá investigar. Se for um óleo essencial, pode pingar uma gotinha pura em uma fita olfativa (ou qualquer papel mais grosso e sem cheiro) ou, se preferir, pode pingá-lo já diluído a 10% em álcool de cereais. Seu objeto também pode ser um chá que tenha feito, um tempero que tenha na cozinha, uma flor que tenha encontrado... Note que a flor, uma vez colhida, vai mudando de aroma conforme perde sua vitalidade. O chá vai perdendo sua potência conforme esfria... um tempero tem mais cheiro se você, antes, o macera. 
Com o objeto aromático em mãos e seu caderno preparado, então, feche os olhos e comece a cheirá-lo. 
Se este é seu primeiro exercício, tente perceber como as diferentes formas de aspirar o ar mudam sua percepção. Fungadinhas mais curtas trazem determinadas informações, aspiradas mais longas trazem outras... Como o aroma muda conforme a distância entre ele e seu nariz? 
Onde sente o aroma? Ele fica no nariz? ele se torna presente na boca? na língua? 
Quais são as primeiras notas que sente? Doce? Verde? Quente? 
Atrás destas primeiras, que provavelmente são dos elementos mais voláteis, que outras notas existem? O que as notas de topo escondem? 
Como se estivesse em uma caverna, vá tentando chegar mais ao fundo do aroma, penetrando suas camadas. 
Procure pela forma do aroma. Como as notas apreendidas se organizam? Tem alguma no meio? quais são as notas mais superficiais? quais são as mais do fundo? 
Procure descrever todas as características que encontrar. A inefabilidade do aroma é sempre complexa para articular em palavras, mas tente cercar o máximo possível aquilo que sente... um aroma pode ser pungente, meio pontiagudo, gritante, aveludado, amadeirado, verde, ardido, doce, aerado ou denso... o vocabulário que pode empregar é infinito, afinal, está descrevendo aquilo que você encontrou para você mesma... é um diário... 
Com o tempo, poderá ir ampliando seu vocabulário aromático e encontrando os consensos de linguagem que já se consagraram no meio... um aroma pode ser âmbar, balsâmico, almiscarado... mas, por enquanto, nesta brincadeira, sugiro que não se preocupe tanto com a linguagem em si e mais com a sua capacidade de acercá-la de sua experiência. 
Se ficou na dúvida enquanto escrevia, retorne ao cheiro e mergulhe novamente. 
Note as mudanças sutis que ocorrem com o tempo, como algumas notas desaparecem ou se modificam e como isso afeta a forma geral e sua estrutura. 
Tente esgotar o aroma, passeie pelos mais íntimos de seus recônditos e anote tudo que encontra. Gosto pessoalmente de me imaginar fisicamente explorando o aroma, como se fosse um lugar, me sinto como que desbravando as profundidades da natureza, um misto de curiosidade e desejo, sem saber o que esperar pela frente. É como se tateasse os caminhos, absorta em atenção... 

Quando achar que esgotou o aroma, a brincadeira acabou. Retorne para o mundo real e tente se lembrar das coisas marcantes que encontrou. Leia suas anotações e teste sua memória olfativa... é capaz de recriar mentalmente o cheiro que sentiu? 

Os aromas têm tempos diferentes. Notas baixas e médias podem durar muito tempo nas fitas olfativas. Se fez a brincadeira com um óleo essencial, retorne à sua fita olfativa algumas vezes durante o dia para notar como o tempo afeta o óleo. Até quando dura seu cheiro? Como ele se transforma? Anote o que encontrar... 

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